Espelho de Afrodite.

• Uma jovem lua chamada Menina, vivia a escutar dos outros que não devia olhar tanto para o mundo que não fosse o seu, que isso não a faria bem e que ela deveria apenas observar ao seu redor. Mas todas as noites, escondida do pai, ela insistia em olhar aquele mesmo planeta azul, imaginando como seriam as coisas dentro dele, pensando se lá encontraria o que via sempre em seus sonhos indecifráveis. Ela não fazia idéia de que dentro daquele planeta azul, as pessoas do sexo feminino eram chamadas por seu nome próprio, meninas, e que cada uma ainda tinha mais um nome.
• Bem distante dali, podia escutar-se os gritos de uma garotinha brigando com seu pai. Cristal, era como a chamavam. Segundo sua família e amigos, Cristal vivia no mundo da lua e escutar a mesma frase durante tantos anos despertou seu interesse pelo céu noturno. Mesmo nova questionava-se como alguém poderia viver tão longe de tudo e com aquelas condições tão diferentes da que conhecia. No seu aniversário do ano anterior, pedira ao pai um telescópio e com muita insistência conseguira um. Ele havia comprado o mais barato, explicando a todos, com convicção, que logo logo Cristal deixaria mais um brinquedo de lado. Porém, todos os dias ao entardecer, a menina pegava o seu telescópio e via a mudança de cores do infinito. Sua mãe sempre anunciava o jantar e a hora de dormir e ela rapidamente se deitava embaixo do edredon , desejando, a todos, boa noite. Ouvia os passos de seus pais chegando no quarto ao lado e esperava algum tempo antes de se levantar. Quando o silêncio pairava na casa, ia na ponta dos pés até a janela, onde encontrava suas lentes de má qualidade posicionadas e ficava a madrugada inteira observando a imagem embaçada de pontos brilhantes no escuro. Na escola, anotava em seu caderno, todo dia, as transformações na forma da lua, o que mais lhe fascinava.
• Em toda fase cheia, Menina ganhava um presente que simbolizava uma etapa completa. Naquela época, todas as luas jovens gostavam de se enfeitar e pediam sempre algo que as fizesse mais vaidosas. Seus pais nunca a perguntavam o que queria e a todo ciclo lhe davam algo que a mesma jamais usaria. A criticavam por não ser igual as outras e não usufruir dos objetos que compravam com tanto sacrifício. Menina falava pouco e não esperava mais com ansiedade por quando ficasse cheia, entristecia ao ver tantas coisas sem utilidade entulhadas em seu quarto. Decidiu, pela primeira vez, escolher um presente. Deixou um bilhete sobre a mesa expressando seu desejo por um livro chamado: A Vida Em Outros Planetas. Voltou a sentir o friozinho na barriga quando se aproximava o seu dia.
• Coincidentemente, Menina e Cristal nasceram no mesmo dia e a principal diferença entre as duas era que a primeira, esperava que a entendessem sem falar muito e a Segunda, discutia suas idéias desde pequena.
• Mais uma ano completo de vida se aproximava para ambas e foi quando se pode ver Cristal dizendo ao pai, aos gritos, que precisava de um telescópio um pouco melhor, pois com aquele não conseguiria enxergar os detalhes que queria. Como esperado, sua figura paterna riu e disse a sua filha que ela realmente não era normal, mas a pedido de sua mulher, dera o que aquela linda criança desejara.
• Já Menina, não pode conter as lágrimas com a frustração de receber aquele cordão tão valioso. Não ficou surpresa também, ao ouvir berros de decepção por terem gerado alguém incompreensível, porém, aceitou o presente. E então no mesmo dia, assim que seus pais saíram, Menina pegou tudo que já havia ganho e foi para rua. Perguntava as pessoas como chegar à livraria do Sr, Mood. Como não costumava sair de casa, se perdeu, mas ao pedir informação a um velhinho que andava pelas redondezas, descobriu que era o próprio Sr. Mood.Ele a levou até sua loja e contou-lhe histórias que a encantaram. Todos diziam que aquele homem era louco, mas a cada palavra, a jovem lua ficava mais fascinada. Por fim, ele pediu desculpas por aceitar o que lhe era oferecido em troca do livro, mas explicou que por ser considerado doido, todos o evitavam, e principalmente, evitavam qualquer coisa que viesse dali. Ela insistiu que não precisava de nada que estivesse entre aquilo que levara e que não se importava com o valor que tinham. E ao ver a felicidade brilhar nos olhos de Menina ao tocar naquelas páginas amareladas, disse que lhe daria o objeto do qual mais gostara, então, subiu as escadas para pega-lo e ao descer percebeu a expressão curiosa de algo nunca visto antes, no rosto a sua frente. Isso é chamado de telescópio e com ele você pode observar outros planetas, disse o velho senhor, despedindo-se e a chamando de lua da Terra. Menina fora invadida por uma alegria imensa e retornava à sua casa relembrando o funcionamento daquele aparelho.
• Ao anoitecer, subiu a montanha mais alta e pôs–se a olhar através daquele buraquinho tão pequeno. Viu o planeta azul mais de perto e percebeu que a luz incidia no lugar do qual mais gostava. Seguia ajeitando as lentes, de modo que pudesse ver ainda mais perto. Foi então, quando sua visão parou em uma janela muito distante e viu outra jovem lua com um objeto igual ao seu, o que fez seu coração acelerar.Ao mesmo tempo, Cristal também via uma menina observando o infinito dentro dele mesmo e se perguntou como alguém poderia estar lá. As duas tentavam fazer sinais para saber se eram vistas uma pela outra e perceberam que sim. Na cabeça de Menina, as luas só residiam ao seu redor e na de Cristal só havia meninas na Terra. Menina e Cristal completavam mais um ano de vida e choravam de alegria, pela primeira vez em suas vidas, quando entenderam os apelidos pelos quais eram chamadas, quando acharam que não poderia haver outros melhores, quando tiveram a certeza de que só elas, cada uma pertencente a um mundo, poderiam entender a grandeza do universo.